Direto de São José dos Campos
- SP aconteceu de 07 a 15 de Julho de 2012 o XI Revelando São Paulo – Vale do
Paraíba. Enraizado no belíssimo Parque da Cidade Roberto Burle Marx, o
Revelando é a oportunidade de expressão da pluralidade cultural do estado de
São Paulo, onde as cidades do Vale do Paraíba e cidades convidadas de outras
regiões mostram sua identidade através do artesanato, culinária, música, dança,
folguedo, manifestação, religiosidade e/ou crença.
Em meio a tantas expressões,
trago aqui um “dedo” de prosa com Denílson José Ferreira de 44 anos. Conhecido
como “Kambukira”, o culinarista traz de sua cidade, Guararema-SP, a famosa
Galinhada de São Longuinho.
Confira
o bate-papo com Denílson Ferreira:
LB
– Como surgiu a tradição de se fazer a Galinhada de São Longuinho?
DF
–
A Galinhada de São Longuinho feita em Guararema é realizada pela Comunidade da
Freguesia da Escada na Festa de São Longuinho, dia 15 de Março. Para quem não
conhece, a única imagem do São Longuinho no Brasil, o santo dos objetos
perdidos, está situada em Guararema na Freguesia da Escada.
Na data festiva
junta-se a comunidade, os comércios locais, as vizinhanças e doamos os
mantimentos para estar sendo feito esta galinhada e oferecer para os devotos de
São Longuinho. Eu não faço porque sempre já temos um conograma, um compromisso
marcado, mas lá é feito mais pela comunidade. A galinhada começou a ser
conhecida e virando um prato típico de Guararema devido à festiva dele.
A galinhada teve início
na época da construção da igreja pelos indígenas orientados pelos jesuítas, com
o tempo ela foi se adaptando. Os jesuítas precisavam alimentar os indígenas,
então tinham que se alimentar com o que eles tinham de mais fartura no
terreiro, que seria o frango, eles faziam bem caldento, um frango cozido com
bastante caldo. Como eram muitos os que comiam, eles tinham que arrumar um
jeito de aumentar e foi nisso que puseram o arroz, com o arroz e o frango o
volume aumentaria de quantidade e assim que foi levantada a igreja e alimentados
os indígenas da época.
Denílson José Ferreira de 44 anos, conhecido
como “Kambukira”
LB
– Como começou o culto a São Longuinho?
DF
–
O São Longuinho era um centurião romano, foi ele quem crucificou Cristo, para
ter certeza que Cristo estava morto ele pegou a lança e o feriu, quando ele
cutucou Cristo com a lança, jorrou-se um líquido, como ele tinha um problema de
visão, esse líquido curou seu problema. Depois disso, ele largou de ser
centurião e foi fazer sua peregrinação, virou monge e saiu pregando sua seita.
No fim de sua vida ele
já tinha um problema nas pernas e foi obrigado a ser amputado, ele ficou sem
perna e quando o pessoal conseguia as graças alcançadas vinham e agradeciam a
ele. Por não ter as pernas, pedia para que dessem os três pulinhos em
agradecimento, era a única coisa que ele pedia, já que não podia mais andar ele
dizia “pela graça alcançada me dê três pulinhos”.
Imagem de São Longuinho
LB
– Na galinhada antiga usava-se a galinha caipira, como é hoje?
DF
–
Na época, era a galinha caipira ou frango de terreiro que nem a gente diz,
porque antigamente existia muita fartura, hoje em dia já tem esse frango de
granja, um frango caipira hoje demora de quatro a seis meses para chegar no
ponto de abate, enquanto que um frango de granja entre 28 a 35 dias já está
indo para o abate, para quem comercializa é mais rápido.
Para a gente trabalhar
como era antigamente com o frango caipira é complicado porque num evento grande
você não consegue uma demanda suficiente de frango caipira. Hoje em dia, poucas
famílias criam o frango caipira porque além de ser demorado, o frango caipira
para ser de boa qualidade tem que estar solto e tratado com milho, nisso tem
uma demora muito grande para estar crescendo. Na minha casa eu gosto de fazer
com o frango caipira, mas 90% da população não gosta do frango caipira, ou
nunca experimentou, ou acha que não é bom, mas até hoje quando eu posso como um
frango caipira.
Galinhada de São Longuinho sendo preparada
LB
– Há quanto tempo você faz a galinhada?
DF
–
Eu faço essa galinhada, podemos dizer profissionalmente, há 12 anos, porque nos
primeiros três anos eu fazia para os amigos em reuniões na minha casa, depois
eu comecei a me profissionalizar e a fazer comercialmente.
LB
– Você nasceu em Guararema?
DF
–
Não, eu nasci no Vale do Paraíba, em Lagoinha onde morei 18 anos e moro há 27
anos em Guararema.
LB
– Quem ensinou-lhe a galinhada?
DF
– Eu achei interessante quando o pessoal falava da galinhada, mas eu nunca
tinha comido nem visto. Numa das reuniões beneficentes que foi feita em
Guararema, fui até o local, comi e gostei. Depois fui convidado para outro
local, um restaurante e estavam fazendo essa galinhada, e comecei a olhar e ver
como que ele fazia, eu e minha esposa, eu olhava para cá e olhava para lá, e falei
“vou tentar fazer em casa”.
Eu não tinha o
equipamento apropriado para ser feito, fui até São Paulo e comprei uma tacha
pequena e comecei a treinar em casa, e pensava “ele faz desse jeito, mas acho
que desse jeito vai ficar melhor”, daí eu fui adaptando, cada vez que fazia eu
tentava melhorar, tentava fazer um prato diferente do que eles faziam e foi aí
que optei fazer só com a sobrecoxa, que para mim é uma carne saborosa, e retiro
a pele porque a pele deixa muito gordurosa. Em vista do pessoal, a maioria faz
com coxa e sobrecoxa, eu prefiro só sobrecoxa que na linguagem caipira é o
famoso Santo Antônio e foi assim que começamos.
LB
– Desde o primeiro ano você traz a Galinhada de São Longuinho?
DF
–
Foi o seguinte, o primeiro ano que eu vim no Revelando, que foi até aqui em São
José dos Campos, eu trouxe outro prato, a “paeja caipira” e foi bem aceita. Nela
vão os ingredientes da roça mesmo: a sobrecoxa de frango desossada, bacon,
costelinha de porco e linguiça calabresa; e fizemos sucesso. No momento eu não
entendia o que era o Revelando São Paulo, me era uma novidade e vim
representado a cidade, e na minha cidade nessa época tinha um restaurante que
vendia muito bem esse prato, me chamaram e eu falei “vamos apresentar o prato
lá”.
Nós trouxemos essa “paeja”,
daí veio um comunicado do Abaçaí (Abaçaí Cultura e Arte, ONG que entre outras
ações realiza o Revelando São Paulo) dizendo que esse prato não era típico, eu
não entendi na época qual era o motivo, depois que eu entendi o significado, aí
eu passei a representar Guararema com a galinhada, então no Revelando da
Capital já fizemos a galinhada, e fui entendendo o espírito do Revelando. Na
época nós pensávamos “vamos vender”, depois entendi direito o que é, no meu
ponto de vista venho mostrar o meu trabalho, como é feito e divulgando nossa
cidade e a gente mesmo.
LB
– Além do frango, o que mais vai na sua galinhada?
DF
–
Em primeiro lugar, nós fazemos em queimadores, é feito todo o processo em
carvão. Os ingredientes que eu uso é um azeite de boa qualidade, alho,
açafrão-da-terra, coloral para poder dar uma cor para o prato, cebola, tomate,
pimentão, arroz e queijo parmesão ralado, esse é o segredo da nossa Galinhada
de São Longuinho lá de Guararema.
LB
– Como é o preparo?
DF
– Primeiro fazemos elas em tachas, o pessoal fala “tachos”, mas o certo é
tachas. Como é feito no carvão nós vamos fazer no fundo dela com o azeite, a
cebola, o tomate e o pimentão. Fazemos aquele refogado e vamos colocando
tempero, o tempero você pode colocar a gosto, o sal com alho que seja, o coloral
e o açafrão, e vai refogando.
Depois coloca a
sobrecoxa para estar cozinhando, assim que a sobrecoxa estiver cozida é
acrescentado o arroz pré-cozido e o queijo parmesão ralado, aí você faz aquele
mexido misturando o queijo, o arroz e o frango, assim que o arroz estiver
chegando ao ponto, você acrescenta o queijo parmesão por cima para poder estar
fazendo o restante do enfeite, e o toque, sempre preparado com amor.
LB
– Além do Revelando você faz a galinhada em outros eventos?
DF
–
Evento de porte grande é só o Revelando São Paulo, o restante eu faço mais
festas particulares, nisso eu já montei um Buffet para mim, então todo mundo
que vem no Revelando, conhece meu prato e gosta, e me convida para ir na casa
deles fazer um aniversário, um confraternização de empresa e até em casamentos
estamos levando essa galinhada, então o pessoal está saindo um pouco do
tradicional churrasco e vindo para o nosso lado caipira.
Praticamente todos os
finais de semana estou fora de Guararema, fazendo festas em São José, São
Paulo, Campinas, São Bernardo, então são várias cidades, vários clientes que a
gente vai adquirindo ao longo do tempo. O Revelando foi importante por isso
também, porque a partir daí eu comecei a trabalhar mais na área da culinária,
cada evento que fazemos adquirimos mais amigos e mais clientes. Aos finais de
semana quando precisa, o Kambukira está lá, levando a tradicional Galinhada de
São Longuinho de Guararema.
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